05/05/2011 , 12:40

JUSTIÇA VENDÁVEL

A deusa da justiça, Themis, é simbolizada como uma mulher que segura em uma das mãos a espada da justiça, na outra uma balança e com os olhos cobertos por uma venda, pois a justiça deveria ser cega, aplicando ao transgressor a justa pena, independente de quem seja ele.

Na condição de um cidadão comum, atuando não no Direito, mas na área da saúde, local onde vemos as angústias humanas manifestas na forma de doenças, convivemos diariamente com a insatisfação e indignação popular com o sistema judiciário, surdo aos clamores e sentimento da população, da qual ele se vem distanciando cada vez mais. Escudados no cipoal de leis emanadas por um Poder Legislativo cuja qualidade fica evidente nos noticiários e altamente sensível e comprometido com os interesses do poder econômico e político, assistimos aos tribunais superiores agindo na contramão dos interesses da sociedade, emanando decisões justificáveis do ponto de vista da interpretação dos códigos, mas que claramente contrariam os seus e meus interesses, cidadãos que pagamos os seus (merecidos) salários.

Querer negar aos promotores ou procuradores de justiça, defensores da sociedade, o poder de investigar atos criminosos é negar à todos nós a possibilidade de ter em nosso país um resultado melhor na luta contra a corrupção e o crime organizado, como em outros países. O acesso aos tribunais superiores por escolha do Executivo, nos deixa com a incômoda sensação de que o compromisso de seus membros passa a ser mais com o poder que o colocou lá, do que com a sociedade que o paga, sensação reforçada pelas decisões protelatórias em processos envolvendo poderosos, ou pela mudança de sentenças socialmente desejáveis usando artifícios das filigranas jurídicas para justificá-las.

Vemos entidades de classe defendendo o discutível direito (do ponto de vista do cidadão) do acesso livre e irrestrito do advogado ao cliente preso, mas pouco as vemos agir contra advogados negligentes ou pouco éticos. A defesa corporativa dos direitos de advogados, juízes, promotores ou de nós médicos, não pode ser maior que seus deveres nem se sobrepor aos interesses maiores da população. O uso, pelos advogados, de artimanhas jurídicas legais, porém imorais, para retardar a aplicação de sentenças justas emperrando a máquina judiciária é solenemente ignorada ou defendida, deixando-nos um incômodo sentimento de sermos apenas joguetes no meio dos interesses pecuniários de classes descompromissadas com os nossos interesses.

A veemência na defesa de privilégios classistas, não é percebida na cobrança do cumprimento dos deveres de seus membros e fica-nos a sensação de que existem cidadãos de “primeira classe” e o resto da população. Aprender a cortar na própria carne, com ouvidorias e corregedorias mais efetivas e rigorosas é uma necessidade, para nos tirar a incômoda percepção de que a justiça se faz cega aos reais anseios da comunidade, pondo em seus próprios olhos uma nova venda e tornando-se, não cega, mas “vendável”.

Dr. José Roberto C. Souza

 

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